domingo, 18 de novembro de 2007

A discriminação invisivel

"Os leitores que me desculpem, mas hoje resolvi assumir-me. Confesso, sou um cota. Já passei o cabo dos cinquenta, o que significa que não tenho valor de mercado, nem sou "papel" em que se aposte na bolsa de emprego.

Teoricamente, em termos físicos sou uma ruína; no plano mental, uma nulidade. Represento, como qualquer homem ou mulher da minha idade para cima, uma incomodidade para o sistema capitalista alguém que está vivo para além do prazo de validade, "incapaz" de produzir valor, de gerar mais valias como deve ser.

É certo que cotas há muitos. O presidente da República tem 67 anos, o primeiro-ministro vai fazer 50, o presidente da Assembleia já tem 59; até Belmiro de Azevedo anda nas 68 primaveras.

Como é verdade que Bill Gates soma 53 anos de vida, George Bush, 60, Tony Blair, 53. Ou que Rupert Murdoch já fez 75 e Balsemão está à beira dos 70, sem que fraqueje a sua pujança como imperadores dos Media. Mas estes, e muitos mais nas mesmas condições que poderia citar, não significam nada.

Os outros, a esmagadora maioria dos acima dos 50, no chamado "mundo civilizado", são vistos como imprestáveis excrescências, que andam a empatar a vida dos jovens activos e dos respeitáveis empreendedores, em busca de sucesso.

Esforçamo-nos por abolir preconceitos instalados. Pregamos a multiculturalidade, repudiamos o racismo, temos leis contra as atitudes sexistas, queremos que se deixe de avaliar alguém em função da sua orientação sexual. Tudo formas de discriminação que a sociedade moderna quer erradicar e muito bem. Mas ninguém, ou quase ninguém, fala da mais letal das formas de discriminação, a discriminação etária. A única invisível.

No pé em que estamos, e com a Segurança Social no estado em que está, o aumento da esperança de vida é um paradoxo, uma calamidade. Vive-se mais, para experimentar a discriminação, a insolvência, o drama. E não adianta aumentar a idade da reforma, se não houver trabalho para os mais velhos...

Eu não quero reformar-me, quero a minha parte na divisão do trabalho social, enquanto tiver lucidez e forças. E tenho-as. Uso-as, desta vez, para clamar contra a mais abjecta das discriminações - a discriminação em função da idade."

Mário Contumélias,
in Jornal de Noticias

1 comentário:

dmadeira disse...

É bem verdade o que diz o texto, mas não podemos tratar assim as pessoas com mais idade, podem não ter a mesma firmeza nas mãos mas tem capacidades mentais e experiência suficiente para poderem trabalhar, temos de pesar que estamos a caminhar para velhos e não para novos assim temos o dever de aceitar e ajudar essas pessoas.